A Escola Estadual de Ensino Fundamental Genoveva da Costa Bernardes, do bairro Lami, em Porto Alegre, realizou uma oficina sobre Educação Menstrual com as turmas do 7º, 8º e 9º anos do ensino fundamental para meninas de aproximadamente 12 a 16 anos, que receberam Mandalas Lunares doadas pela Amaluna, nosso braço social. A responsável pela ação foi a professora Rafaela Delacroix, que já havia realizado outras oficinas com edições antigas da Mandala Lunar.
Para a atividade, as turmas foram separadas entre pessoas com vulva e pessoas com pênis, para que os adolescentes já compreendessem que a ideia da atividade era relacionada aos genitais já desde a separação das turmas, e também pudessem ficar mais à vontade para tirar dúvidas e conversar sobre o corpo sem tanta vergonha. Assim, em cada sala, um professor ficou responsável pela explicação sobre os órgãos genitais daquele grupo, identificando seu local no corpo, seus nomes e funções, junto de um cartaz ou livro didático, e também cuidados com a saúde e higiene, seguida de uma roda de conversa, perguntas e relatos dos alunos e das alunas.
Na sala das pessoas com vulva, a professora Rafaela relata que o tempo que tiveram foi de muitas trocas e aprendizados, e que em geral poderiam ter ficado mais tempo, pois as meninas trouxeram muitas perguntas e curiosidades. Elas sentaram-se em círculo e a professora iniciou a atividade trazendo um questionamento: “Vocês sabem o nome do órgão genital externo feminino?”.
Em quase todas as turmas, quase ninguém sabia. Assim, fizeram uma lista com os nomes que cada uma delas chamava. Vieram diferentes deles: xota, xibu, perereca, buceta, vanessinha, larissinha, partes íntimas, etc. Algumas delas relataram que sequer chamavam por algum nome, pois consideravam feio.
Após esse momento, a professora trouxe para suas alunas sobre a importância de dar nomes e falar sobre o nosso corpo, pois assim podemos cuidar dele, além de perceber e relatar alguma situação que possa ocorrer, como coceira, bolinhas, assadura, dor, reforçando que, se não soubermos nomear o local do nosso corpo, podemos desenvolver doenças.
Desenhando uma vulva em uma folha de papel que estava no centro da roda, Rafaela foi nomeando as partes no desenho: lábios externos, lábios internos, clitóris, uretra, canal vaginal. Ao falar sobre higiene, muitas meninas relataram que cortavam os pelos com gilete por orientação da mãe, que diziam ser higiênico. Então a professora falou sobre a importância dos pelos pubianos e a proteção física que eles trazem, e também sobre a flora bacteriana benéfica que vive ali, explicando sobre a importância de usar sabão apenas externamente, pois na parte interna não se prolifera a sujeira e por isso não é nojento nem fedorento.
Outro ponto trazido durante a oficina foi sobre a diferença da uretra, por onde sai o xixi, e o canal vaginal, por onde sai a menstruação e por onde o bebê passa durante um parto vaginal. Muitas adolescentes acreditavam que era apenas um só local para todos esses tópicos e se surpreenderam com essa descoberta. A professora as incentivou a olhar para sua vulva, com espelho ou diretamente, para descobrir mais sobre seu corpo – o que muitas relataram nunca ter feito, por vergonha.
Depois, elas passaram para os órgãos internos e a função de cada um deles, assim como entraram na temática do ciclo menstrual.
“De onde vem o sangue? É sangue sujo? Quem já menstruou?” foram algumas perguntas trazidas pela professora.
Nesse momento, fizeram uma roda de relatos sobre como foi a primeira menstruação de cada uma, onde elas estavam quando aconteceu, o que sentiram, quem as ajudou e como a família reagiu.
Algumas compartilharam constrangimentos por familiares, que contavam para todo mundo (até para desconhecidos na fila da padaria), outras disseram que já se sentiam preparadas, pois a mãe ou irmã mais velha já tinham explicado um pouco sobre como seria, e algumas relataram sentir medo, por pensar que tinham se machucado ou por ficar com vergonha e não querer deixar de ser criança.
A professora Rafaela relata: “Algumas viveram esse momento em grande solidão e abandono, sem nenhum apoio emocional, nem logístico. Uma delas relatou que só anos depois teve uma sogra com quem pode conversar e que explicou melhor para ela.”
De forma lúdica, elas aprenderam sobre como o ciclo ovulatório-menstrual funcionava em termos fisiológicos e sobre como nossa forma de vida fez com que a menarca viesse cada vez mais cedo para as meninas.
No chão, seguiram a dinâmica dos desenhos, dividindo o ciclo em 4 semanas e montando como era cada semana para as meninas ali presentes.
Em relação à menstruação, a professora Rafaela sempre fazia questão de mostrar a elas sobre como gostava de menstruar, que sentia-se tranquila nesse momento e com menos irritações. Em geral, as meninas relataram que odiavam menstruar, que sentiam-se sensíveis, irritadas, com cólicas, sujas e com muita vontade de chorar.
Escrevendo o que cada uma sentia em cada momento do ciclo, as meninas foram compartilhando histórias e compreendendo como reconhecer também o momento da ovulação, pois, em grande parte, elas só sabiam da pré-menstruação e da menstruação.
No fim da conversa sobre menstruação, elas também conversaram sobre as meninas se fortalecerem e se apoiarem umas às outras. As oficinas aconteceram com as turmas dos diferentes anos juntas, com o intuito de aproximar as meninas de séries diferentes e que muitas vezes têm algum desentendimento – normalmente por conta de meninos e crushes.
Elas viram que, apesar desses desentendimentos, todas tinham TPM, cólica e sensibilidades, e que é muito importante fazerem redes de apoio na escola, desde emprestar absorventes até oferecer abraços quentinhos quando uma estiver mal, além de acolherem as meninas que podem passar pela menarca na escola (às vezes sem estarem preparadas, manchando uma roupa ou tendo medo) ficando atentas para acolher uma situação assim, seja no banheiro ou na sala de aula.
Ao final, a professora entregou a elas a Mandala Lunar recebidas a partir da Amaluna, mostrando que era uma agenda que elas podiam usar como diário, mas também para marcar provas, ler textos inspiradores, desenhar e aprofundar tudo o que elas haviam conversado na oficina. Rafaela mostrou a elas a roda do ciclo e o diagrama lunar, ensinando como elas podem usar para conhecerem mais de si mesmas, estudarem seu ciclo menstrual, seu corpo e suas emoções.
A professora Rafaela relatou: “Elas ficavam muito encantadas quando viam a agenda. A beleza da capa e delicadeza das imagens mexeu com elas. Uma vez uma aluna me disse que nunca havia ganhado um presente tão bonito assim. E esse ano, um dia depois da oficina que fizemos, uma menina do 7º ano, que não menstruou ainda, veio me contar que já tinha lido toda a parte inicial que eu sugeri que lessem em casa!”.
Além disso, outro relato muito bonito que a professora recebeu foi de uma aluna que encontrou no ônibus alguns dias após a oficina e ela disse que a Mandala Lunar havia ajudado muito na autoestima dela, contando que sempre que ela ia tomar banho e sentia-se desconfortável com o seu corpo, que ela considera gordinho, ela lembrava de uma ilustração da Mandala de uma menina com o corpo parecido com o seu e que ela achava linda. Ela disse que nunca tinha visto um corpo como o dela sendo representado de forma tão bonita como estava ali.
A professora também relatou sobre um menino muito tímido, do 9º ano, que pediu uma agenda no final da aula. Ele disse para a professora que não menstruava, mas que tinha alterações no humor e se interessava muito pelo assunto. Quando recebeu a Mandala Lunar, saiu da escola já lendo a agenda pela rua.
A professora Rafaela conclui dizendo: “Fico muito feliz quando fazemos essas oficinas, pois abrimos um espaço raro na escola — de intimidade, cuidado e escuta. Muitas alunas me perguntaram quando seria a próxima. Vejo que as meninas gostaram muito e sentiram-se à vontade para perguntar coisas que num geral não teriam coragem de perguntar. Uma das turmas ficou muito animada com a atividade e talvez a gente faça outra atividade com elas em um sabadão letivo aberto à comunidade. Imagino que alguns ecos da oficina vão brotar com o decorrer do tempo, não são ‘resultados’ imediatos, mas uma semeadura ao vento, que vai germinar mais para frente. Para algumas delas, são muitas informações novas, ideias, perspectivas, é um conhecimento que fica quietinho ali e que acredito que, em alguns anos, vai emergir.
Agradeço muito à Mandala Lunar pelas agendas doadas. Fazer essa atividade me relembra porque escolhi ser professora e qual é o meu papel nas escolas, pois me devolve o sentido que às vezes vai sendo esquecido e encoberto pelos tantos afazeres que temos.”